(Artigo publicado em novembro/2007)
O dia parecia igual aos outros. Ao acordar, comecei
minha leitura matinal, mas algumas questões pareciam não sair de minha mente.
Quantas pessoas falam ser o que não são? Quantas pessoas vivem sonhos que não
são seus? Quantas pessoas reproduzem e assimilam mazelas de nossa sociedade?
Quantas pessoas confudem o “ter” com o “ser”?
Parecemos
viver numa sociedade fundamentada no ¨ter¨, nas aparências e no status que o
dinheiro pode oferecer. Assistimos as pessoas consumindo nos shoppings,
dirigindo seus carros na solidão dos vidros fumês, e em raros momentos nos
perguntamos se elas são felizes.
Ao tentar continuar minha leitura, mais uma
informação reforçou minhas reflexões. O IBGE divulgou em sua última síntese de
Indicadores Sociais que 46% dos jovens brasileiros vivem na pobreza, e não vi
ninguém questionando a gravidade deste dado. Parecia ser natural, como muitas
outras situações que a rotina nos faz naturalizar.
Estamos falando de seres humanos de 0 a 17 anos que
estão começando a conhecer a vida, a construir sua identidade e que deveriam
ser amparados tanto do ponto de vista socioeconômico como afetivo. Estes jovens
deveriam estar em famílias cuja convivência os entregassem ao mundo prontos
para desvendá-lo com criatividade e esperança. Eles deveriam conhecer o belo, o
bom, a poesia, a música a literatura. Mas, ao contrário, conhecem as agruras da
vida já no nascedouro, e tragados pela sociedade do ¨ter¨.
Sabemos como é difícil uma família assumir as
responsabilidades da criação de filhos quando a violência da fome, da falta de
moradia, da insegurança estão presentes à mesa, no dia-a-dia. Sabemos também
como hoje as escolas têm dificuldade de dialogar com estes jovens e dar sentido
à prática educacional como ferramenta de superação desta realidade. O que resta
então a estes 46% de brasileiros pobres?
Resta a eles que nós, todos nós, tenhamos coragem
de assumir um pacto pela juventude brasileira e construir uma sociedade
fundamentada no ¨ser¨, que nos envolvamos com seus problemas, que visitemos
suas escolas, que não os deixemos nas mãos da indústria das drogas, a começar
pelas lícitas, que entram pela porta da frente das nossas casas.
O poder público precisa rever suas prioridades de
investimentos e implementar políticas voltadas ao jovem, dando-lhe oportunidade
de acesso aos bens culturais e, acima de tudo, promover os valores culturais
que são próprios da juventude. A exemplo da música do grupo Titãs, o jovem não
quer só comida, ele quer comida, diversão e arte. O jovem quer lazer, o jovem
quer amar... O jovem quer a paz!!! Acredito nisto pelo contato que tenho com
centenas de jovens que frequentam nossos projetos sociais na Unaerp.
Somente os jovens podem experimentar outra
realidade. Somente pessoas movidas por sonhos e idealismo podem conhecer, mesmo
que no campo das ideias, um outro mundo. E isto sempre foi missão histórica da
juventude e precisamos enxergar o poder transformador dessa parcela da
população, que se revela através da sua música, de suas gravuras, de suas
tribos. Quem acredita que o “ser” é mais verdadeiro que o “ter”, com certeza
está do lado destes 46% de jovens brasileiros. Vamos juntos resgatar nossos
sonhos, fortalecer nossos ideais e transformar nossa sociedade na sociedade do
“ser”.
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